Fonte: Biblioteca Digital de Literatura de Países Lusófonos

 

LITERATURA BRASILEIRA

Textos literários em meio eletrônico

Obra Poética de Gregório de Matos


Edição de Referência:

Obra Poética, de Gregório de Matos, 3ª edição,

Editora Record, Rio de Janeiro, 1992.

OS SEUS DOCES EMPREGOS

A HUMA DAMA POR NOME MARIA VIEGAS, QUE FALLAVA FRESCO, E CORRIA POR CONTA DO CAPITÃO BENTO RABELLO SEU AMIGO.

ANATOMIA HORROROSA QUE FAZ DE HUMA NEGRA CHAMADA MARIA VIEGAS.

A MESMA MARIA VIEGAS SACODE AGORA O POETA ESTRAVAGANTEMENTE, PORQUE SE ESPEYDORRAVA MUYTO.
 

OS SEUS DOCES EMPREGOS

COTA

 
 

Por nome Maria Viegas, fallava fresco e corria
por conta do Capm. Bento Rabello

Manuel Pereira Rabelo, licenciado

Meus recados à Velhinha,
outros tantos à Mulata
à Negrinha da corrente
e às vossas Damas pintadas

A HUMA DAMA POR NOME MARIA VIEGAS, QUE FALLAVA FRESCO, E

CORRIA POR CONTA DO CAPITÃO BENTO RABELLO SEU AMIGO.

 
 

Senhora Cota Vieira,
Deus me não salve a minha alma,
se vós não me pareceis
uma linda, e gentil dama.
Tão risonha como a Aurora,
tão alegre como a Páscoa,
mais belicosa, que o fogo,
e mais corrente, que a água.
Picará como nascida
na picardia da França,
e assim francesa nas obras,
Portuguesa nas palavras.
Tudo chamais por seu nome
tão propriamente, tão clara,
que ao cono lhe chamais cono,
chamais caralho à caralha.
Malditas da maldição
de Deus sejam as tavascas,
que de surradas nas obras
põem de bioco as palavras.
Há cousa como chamar,
o que uma cousa se chama,
porque sirva de sustento
à luxúria, que desmaia.
Há cousa como falar,
como o Pai Adão falava,
pão por pão, vinho por vinho,
e caralho por caralha.
Quem pôs o nome de crica
à crica, que se esparralha,
senão nosso Pai Adão
quando com Eva brincava?
Pois se pôs o nome às cousas
o Pai da nossa prosápia,
porque Deus lho permitiu,
nós por que hemos de emendá-las?
Mas tornando ao vosso garbo,
sois, Maricas, tão bizarra, que
estive nem mais nem menos
por vos dar a piçalhada.
Tive debaixo da língua
o pedir-vos uma lasca
da nata do vosso cono,
se é, que tem côdea essa nata.
Quando a culatra vos vi
tão tremenda, e rebolada,
meti logo a mão à porra,
e estive saca, não saca.
Mas reverente adverti,
que ali o Capitão estava
senhor das minhas ações
e dono da vossa casa.
Porque inda que sempre diz,
que assentou convosco a espada,
eu creio, no que Deus disse,
não no que um berrante fala.
Quem, o que deve a um amigo
em respeitos lhe não paga,
não é amigo, nem homem,
é uma besta assalvajada.
Mas andar, foda ele embora,
isso não importa nada,
teremos amores secos,
seco é o biscouto, e campa.
Falaremos sempre aos molhos,
e riremos às canadas,
folgaremos, que amor seco
sem molhar beiço se passa.
Irei conversar convosco,
e a reverenda Madrasta
entre os pontinhos que der
meta sua colherada.
Assim se passa uma vida
tão santa, e tão ajustada,
que ganharemos o céu
na sacra via às braçadas.
Meus recados à Velhinha,
outros tantos à Mulata,
à Negrinha da corrente
e às vossas Damas pintadas.

ANATOMIA HORROROSA QUE FAZ DE HUMA

NEGRA CHAMADA MARIA VIEGAS.

 
 
 

1    Dize-me, Maria Viegas
      qual é a causa, que te move,
      a quereres, que te prove
      todo o home, a quem te entregas?
      jamais a ninguém te negas,
      tendo um vaso vaganau,
      e sobretudo tão mau,
      que afirma toda a pessoa,
      que o fornicou já, que enjoa,
      por feder a bacalhau.
 

2    Se tu sabes, o que é
      o teu vaso furta-fogo,
      como tens tal desafogo,
      que te pespegas em pé?
      dizem, para Marapé
      fugira o triste Silveira
      está tão correspondente
      ao vaso, que juntamente
      serra uma, e outra fronteira.

 3     Tu, me dizem, que fretaste
        ao galante de antemão,
        e que na tal ocasião
        também foste, a que o chamaste:
        o teu intento lograste:
        mas podias advertir,
        que não era bem dormir
        (sendo tu ruim) com quem
        te cataneasse bem,
        como podes inferir.

 
 

  4    Vendo-se tão perseguido
        o pobre do pecador,
        não deixou de ir com temor
        por ver, que tens vaso ardido:
        e assim de pouco sofrido,
        vendo-se quase atolado
        se safou desesperado,
        e diz, que tem grande mágoa,
        que havendo nele tanta água,
        sempre esteja emporcalhado.

 
 

  5    Diz, que achou tal apicu
        tão tremendo, e temerário,
        que só membro extraordinário
        abalaria esse cu:
        com guelras de Baiacu
        (diz) que se farta o teu Tordo,
        e assim que vaso tão gordo,
        tão grande, e com tal bocaina
        busque maior partezaina,
        que eu por isso é, que vos mordo.
 

 6     Diz, que sois como um champrão
        que nem esporas de pua
        farão bolir tal charrua
        com vezos de galeão:
        se fincas o cu no chão,
        como, puta, te ofereces?
        e se a todos ruim pareces,
        deixa já de fornicar,
        que se eles te vão buscar,
        é porque os favoreces.

 
 

7    Diz mais, que quando acabaste,
      deste peidos tão atrozes,
      que começou a dar vozes
      por ver, que te espeidorraste:
      e que também lhe rogaste,
      depois de se ter tirado,
      te fornicasse virado,
      pois de costas não podia,
      porque, quem tanto bolia,
      era força estar cansado.
 

8    Saíste toda com susto,
      e vendo ao triste queixar,
      te puseste a escutar,
      pois se queixava tão justo:
      nada tem ele de injusto,
      antes a metade cala,
      e só a mim me regala
      dizer, que atolava inteiro,
      se a um ramo de araçazeiro
      se não pegara por gala.

 
 

9    Guardaste triste merenda
      para o triste do coitado,
      que ficou tão enjoado,
      que promete ter emenda:
      e com tão grande Calenda
      se veio de ti queixando,
      que toda a gente pasmando
      está de ver, que o teu vaso
      é a fonte do Parnaso
      nas águas, que está manando.

 
 

10     Ao burlesco será cono,
         ao tudesco chancarona,
         c'uma crica de azeitona,
         onde encrica todo o mono:
         daqui a razão entono
         para te satirizar,
         e se outra vez pespegar
         quiseres, busca, garoupa,
         quem no vaso entupa a roupa,
         se a roupa o pode entulhar.

 
 

11     Anda a triste fralda tal,
         tão hedionda, e molhada,
         que só pode ser coroada
         com fogo de São Marçal:
         considere cada qual,
         o que o Moço passaria
         ao ver-se na estrebaria
         daquele tremendo vaso,
         que joga rasteiro, e raso
         tão nojenta artilharia.

 
 

12    Não terás vergonha, puta,
        de com tão ruim pentelho,
        sobre seres vaso velho,
        tomes a capa de enxuta?
        és puta tão dissoluta,
        que diz o Moço enjoado,
        que já ficou ensinado,
        e nunca mais te veria,
        porque sempre d'água fria
        há medo o gato escaldado.

A MESMA MARIA VIEGAS SACODE AGORA O POETA ESTRAVAGANTEMENTE,

PORQUE SE ESPEYDORRAVA MUYTO.

 
 

1     Dizem, que o vosso cu, Cota,
       assopra sem zombaria,
       que parece artilharia,
       quando vem chegando a frota:
       parece, que está de aposta
       este cu a peidos dar,
       porque jamais sem parar
       este grão-cu de enche-mão
       sem pederneira, ou murrão
       está sempre a disparar.
 

2    De Cota o seu arcabuz
      apontado sempre está,
      que entre noite, e dia dá
      mais de quinhentos truz-truz::
      não achareis muitos cus
      tão prontos em peidos dar,
      porque jamais sem parar
      faz tão grande bateria,
      que de noite, nem de dia
      pode tal cu descansar.

 
 

3     Cota, esse vosso arcabuz
       parece ser encantado,
       pois sempre está carregado
       disparando tantos truz:
       arrenego de tais cus,
       porque este foi o primeiro
       cu de Moça fulieiro,
       que tivesse tal saída
       para tocar toda a vida
       por fole de algum ferreiro.

  

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